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sábado, 16 de março de 2024

CRÍTICA| O CRIME DO PADRE AMARO, DE EÇA DE QUEIRÓS

Crítica e questionamento sobre a Igreja

Por Victor Hugo Sigoli de Campos

Data: 08/03/2024






O livro é de 1875, e foi escrito pelo português Eça de Queirós com base nos princípios do realismo-naturalismo – um movimento artístico cuja ideia é a de que o comportamento do ser humano é moldado pelo meio onde nasce ou em que é criado. Amaro Vieira vai ao distrito de Leiria nas proximidades de Lisboa substituir o pároco recém - falecido José Miguéis, na Igreja da Santa Sé, ele fica hospedado na casa de Augusta Caminha uma assídua devota e se apaixona por sua filha, Amélia.          

Amaro presencia seu mestre, o cônego João Dias tendo relações sexuais com Caminha e entende que pode fazer o mesmo com Amélia, e vai coagindo-a em todos os momentos quando ficam sozinhos, e desperta os ciúmes de João Eduardo, o noivo da moça, e entra em conflito com o rapaz. A história critica a religião, também é interessante observar que a narrativa aborda aspectos psicológicos dos personagens, principalmente, a temática de opressão da libido imposta pela doutrina.  

João Eduardo conta ao redator Agostinho do jornal A Voz do Distrito sobre a má conduta clerical em Leiria, e o amigo publica um artigo relatando a imoralidade e corrupção religiosa de “alguns padres” da cidade. A publicação assusta Amaro, João Dias, entre outros confrades, a opinião pública sobre a igreja é impactada, e suas reputações ficam ameaçadas.        

Leitura de trecho da página 75: “Amélia todo o dia pensou naquela história. De noite veio-lhe uma grande febre, com sonhos espessos, em que dominava a figura do frade franciscano, na sombra da do órgão da Sé de Évora. Via os seus olhos profundos, reluzirem numa face encovada: e, longe, a freira pálida, nos seus hábitos brancos encostada às grades negras do mosteiro, sacudida pelos prantos do amor! Depois, no longo claustro, a ala dos frades caminhava para o coro; ele ia no fim de todos curvado, com o capuz sobre o rosto, arrastando as sandálias, enquanto um grande sino no ar nublado, tocava o dobre dos finados. Então o sonho mudava; era um vasto céu negro; onde duas almas enlaçadas e amantes, com hábitos de convento e um ruído inefável de beijos insaciáveis, giravam, levadas por um vento místico; mas desvaneciam-se como névoas, e na vasta escuridão ela via aparecer um grande coração em carne viva todo trespassado de espadas – e as gotas de sangue que caíam dele enchiam o céu de uma chuva escarlate”. O trecho é um sonho de Amélia e revela um aspecto psicológico, o desejo sexual pelo padre, pois, está em um ambiente religioso, e exposta ao seu assédio.

A marquesa de Alegros foi a preceptora de Amaro, e deu a ele educação religiosa como forma de pagamento pelo trabalho do seu pai na sua fazenda, e introduziu-o na vida teísta. Na infância, a condessa viu o comportamento dele como muito libidinoso, então desde cedo o padre foi ensinado a suprimir o desejo sexual, assim como, Amélia filha de uma mulher muito devota, e instruída por ela a conservar a virgindade para se casar “pura”. O dogma impede a natureza sexual de despontar, obstruindo o autoconhecimento, gerando consequências na vida dos personagens.  

O padre Amaro sabe que se apaixonar está errado, no entanto, ele segue com seus desejos, em cada interação com a jovem cristã, ele a seduz olhando, tocando, falando, até corromper os celibatos de ambos. Amélia entende que a relação com seu preceptor é problemática, mas está exposta a ele, e se sente impedida de falar a mãe sobre os abusos do pároco, por medo de punições. Os amantes permanecem se encontrando por vários meses, enquanto a obsessão e manipulação de Amaro aumentam, e Amélia fica oprimida, isolada e incapaz de reagir. 

Eça de Queirós escreveu um livro reflexivo sobre a Igreja cujo público são os fiéis, desenvolve a relação deles com os padres, caracterizados como falsos, controladores, controversos, no século XIX quando Portugal ainda era um país extremamente católico. Naturalmente, o livro caiu como uma bomba sobre a sociedade sendo rechaçado pela Igreja Católica, pois seu enredo é irônico e satírico, em alguns momentos repudiamos os eclesiásticos e nos outros rimos de suas peripécias, eles pregam ideais, mas descumprem, manipulam os devotos para benefício próprio, distorcem os conceitos de fé e usam a religião para alcançar o poder. Existem clericais que dão paz, alento, perdão, aos seus seguidores, e Queirós reconhece isso, porém, a sua ideia é desconstruir uma das instituições mais simbólicas do ocidente, postulante de valores e costumes, enfatizando desde a educação recebida pelos religiosos, e chegando a ponto de deturparem a doutrina, assim sendo, Amaro um padre que está conflito consigo mesmo e pervertendo a fé.        


Ficha técnica do livro


País de origem: Portugal


Nome: O Crime do Padre Amaro   


Autor: Eça de Queirós


Editora original: -


Ano da publicação original: 1875


Editora no Brasil: Círculo do Livro


Tradução: -


Ano de publicação: -


Páginas: 490



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